sábado, 30 de abril de 2016

MAIO/2016: MYTHICO LABYRINTHO ETYMOLOGICO





Accabo de ganhar novo leitor deste bloguinho de notas, que é novo tambem
na edade, 22 annos. Chamado Euclydes, traz-me duas questões que,
comquanto ja tractadas exhaustivamente por mim, aqui e alhures, merescem
ser sempre... renovadas. A primeira diz respeito ao emprego do "Y"; a
segunda, do "PH". O joven enthusiasta da etymographia me pede algumas
dicas para, segundo elle, mappear os "neophytos" no "labyrintho grego"
da "mythologia etymologica", como define a nossa matriz grecolatina.


Quanto ao "PH", deixo para a proxima postagem a dica sollicitada. Quanto
ao "Y", farei agora uma abbordagem bem didactica. A curiosidade do
Euclydes nasceu de seu proprio nome, ja que foi baptizado assim em
homenagem ao escriptor Euclydes da Cunha. Occorre que elle verificou, ja
na faculdade, que agraphia correcta seria EUCLIDES e ficou confuso.
Affinal, o auctor de OS SERTÕES viveu na phase em que a etymographia era
vigente. Como poderiam ter errado ao registrar seu nome em chartorio,
numa epocha em que o nivel de escholaridade dos funccionarios lettrados
devia ser mais elevado? Boa pergunta, mas tractando-se de Brazil sempre
houve gente despreparada occupando cargos por appadrinhamento ou, como
se dizia, "pistolão", coisa que paresce não ter mudado nos nossos tempos
de alto QI (Quem Indica), não é mesmo?


Para responder ao Euclydes, começo lembrando o caso do professor
Zerbini, famoso cardiologista, pioneiro dos transplantes no Brazil. Seu
prenome era Euryclides. Note-se que a palavra é composta de dois affixos
gregos e o "Y" só occorre no primeiro delles, EURY, que significa
"largo" ou "extenso". Meu DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO traz um glossario
desses affixos. Pois bem: segue-se que o nome de EUCLIDES (em grego
EUKLEIDES) tambem é composto de dois elementos, sendo o primeiro EU (que
significa "bom") mas não sendo o segundo o mesmo CLIDO que significa
"clave" ou "chave" e sim KLEOS, que significa "gloria". Fazem sentido,
pois, as traducções de "ampla gloria" para EURYCLIDES e de "boa gloria"
para EUCLIDES. A confusão na graphia de EUCLIDES tem ao menos uma
utilidade: distinguir os adjectivos EUCLIDEANO (referente ao mathematico
Euclides) e EUCLYDEANO (referente ao escriptor Euclydes da Cunha), para
effeitos estrictamente theoricos. Na practica, o que interessa é
introduzir alguem no universo philologico, de modo a preparal-o para
discernir de prompto quando uma origem grega justifica a graphia com "Y"
em logar de "I".


Antes de proseguir, transcrevo o trecho que tracta do "Y" no MANUAL
ORTHOGRAPHICO BRAZILEIRO de Julio Nogueira, ao qual sempre tenho de
fazer varios reparos:


{Esta lettra appresenta, mais ou menos, a forma que tinha o "ypsilon"
grego maiusculo (Y). O seu valor originario era o de um "U" francez ou
de um "Ü" allemão. No romaico ou grego moderno confunde-se com o de um
"I". No portuguez foi sempre o de um "I", dando occasião a duvidas
graphicas. Na graphia anteclassica o "Y" representava o duplo "I":
CORREYO, FEYO etc., como no francez PAYER. O "upsilon" foi transcripto
por "Y" no latim, de onde directamente nos provêm as palavras em que
figura, alli ja existentes. Algumas vezes foi transcripto por "U", como
em MURTA (tambem MYRTA), TUMBA e, mais raramente ainda, por "V":
EVANGELHO. Em syllaba inicial é precedido do "H", indicando esta lettra
a aspiração constante do "ypsilon" grego. O "H", neste caso, é mais um
signal, um espirito, do que uma lettra, "Spiritum magis quam litteram
dici opportet" (Aulo Gellio). Daquella convenção resultam as graphias
HYDRA, HYENA, HYMNO etc. Esta aspiração desapparesceu ja no latim,
ficando, porem, o "H" inicial como um simples indicio etymologico. É
caso singular a falta de aspiração inicial na propria palavra grega
YPSILON, o nome da lettra, razão por que não a escrevemos com "H". No
corpo da palavra dá-se ainda a transcripção do "ypsilon" por "Y":
ABYSMO, CYNICO, DYNAMITE, ESTYLETE, ESTYLO, GYNECEU, IDYLLIO, LYRA,
LYRICO, ONYX, PORPHYRO, TYMPANO, TYRANNO, etc. Está oblitterado em
ANEURISMA, forma que se generalizou. O desconhescimento desses preceitos
tem determinado o emprego erroneo do "Y" em palavras como: COLISEU,
ECLIPSE, ENIGMA, ESTIGMA, ESPHINGE, LIRIO, GIRIA, OLIGARCHIA, SATIRA
(por confusão com SATYRO), SIPHÃO e outras onde tal lettra não tem razão
de ser. Em casos de digraphia determinados pelo uso é preferivel "I":
LAGRIMA, GIRO, GIRAR, GIROSCOPIO. O "Y" mantem-se no portuguez em
palavras de origem ingleza ou que nos vieram por intermedio do inglez:
YANKEE, YACHT, JOCKEY, TILBURY, PENNY, WHISKY, JURY, DANDY, RAILWAY,
TRAMWAY, BOY-SCOUT, etc. Apparesce ainda o "Y" em palavras de outras
linguas: YATAGAN, BEY (turco). Por uma convenção pouco acceitavel o "Y"
entrou para a graphia de palavras da lingua tupy. Ha nesta um "I"
guttural, que, sem correspondente na nossa phonologia, ora foi
transcripto por "I", ora por "Y", ora por "U". O visconde de
Beaurepaire-Rohan menciona o facto de existir aqui a freguezia de
Guaratyba e no Paraná, a villa de Guaratuba, quando estes dois vocabulos
são a mesma cousa pela origem e significação. O "Y" deveria corresponder
a esse "I" guttural que Montoya representa por um "I" latino com o
signal de breve, Anchieta, por um "I" com um poncto subscripto e por
"IG", no fim da palavra. Deu-se, porem, a confusão e o "Y" apparesce em
palavras como TUPY, GUARANY etc.}


Commentemos, então, os ponctos annotados por Nogueira e, em seguida,
farei minha synthese do assumpto. Em primeiro logar, lembremo-nos de que
Nogueira, embora contrario às reformas phoneticistas, fazia concessões a
uma simplificação que nós, etymologistas, não acceitamos. Assim, o "Y"
de ANEURYSMA só foi "oblitterado" por quem quiz engolir tal
"oblitteração", pois na phase prequarentista nenhuma lei obrigava (nem
desobrigava) ninguem a adoptar um systema dicto "mixto", que mesclava
formas mais ou menos rigorosas. ANEURYSMA leva "Y" tanto quanto ABYSMO
ou CATACLYSMA (tambem na forma CATACLYSMO), inquestionavelmente.
Portanto, em casos de digraphia é preferivel, isto sim, o "Y" ao "I",
como em GYRO, GYRATORIO, LAGRYMA ou LACRYMOGENEO. Quanto a COLYSEU, o
simples facto de que, em algum momento, tenha havido a forma latina
COLYSEUS (ainda que "medieval") é o sufficiente para que a acceitemos
como succedanea da original COLOSSEUM. Quanto a SATYRA, ja expliquei,
neste mesmo blog, que é tão latina quanto SATURA ou SATIRA:


{Succede que, no alphabeto romano, as lettras "U" e "V" eram
representadas só pelo "V", donde a graphia AVGVSTVS para AUGUSTUS. Ora,
a pronuncia do upsilon grego era semelhante ao "U" francez ou ao "Ü"
allemão, soando como uma fusão de "U" e "I". Dahi a solução latina de
collocar um "V" sobre um "I", creando a lettra que passaria a ser
chamada de ypsilon. Todos os graphemas que passaram do grego ao latim e
à actualidade foram translitterados assim, como CYCLO, DYNAMO, HYDRO,
KYSTO, LYRA, MYTHO, NYMPHA, PSYCHO, RHYTHMO, SYNTHESE ou TYPO. Algumas
formas, porem, permanesceram oscillantes, vacillando entre uma e outra
vogal, como em MURTA e MYRTA. É o caso de SATYRUS que, na accepção
feminina SATYRA, mixturou SATURA e SATIRA para designar a miscellanea
poetica a serviço da mordacidade e da malicia. SATURA tem a ver,
inclusive, com o verbo SATURAR. Evidentemente, o correcto seria
preservar a transcripção SATYRA, com os respectivos cognatos SATYRICO e
SATYRISTA, ao lado de SATYRISMO e SATYRIASE, referentes a SATYRO. Assim
fez Bilac quando, em seu TRACTADO DE VERSIFICAÇÃO, graphou SATYRA para
alludir à poesia mordazmente critica. Aqui me penitencio por ter dicto
que elle havia commettido um equivoco e ja registrei a resalva no meu
diccionario. O problema é que os maldictos phoneticistas sempre forçam a
barra para nos induzir ao erro, quando affirmam categoricamente,
inclusive em diccionarios de larga credibilidade, que SATYRO nada teria
a ver com SATIRA. Cumpre-nos desmascarar taes manobras, que escamoteiam
a verdade historica a serviço da malfadada simplificação pretendida
pelos reformistas da orthographia. Pau nelles!}


Nem me detenho na questão dos tupynismos, pois estou com José de
Alencar, Theodoro Sampaio e outros auctores que sacramentaram aquella
convenção que Nogueira chama de "pouco acceitavel" mas que eu considero
plenamente acceitavel. Passemos, pois, ao poncto que nos interessa, que
é o caminho mais curto para nos habituarmos ao "Y" dos hellenismos. Tal
como numa tabuada arithmetica, a memorização é indispensavel a um
vocabulario basico, seja no quotidiano ou no meio scientifico. Termos
como CYCLO, HYPO ou TYPO são fundamentaes, inclusive nas formas
derivadas como BICYCLETA, ENCYCLOPEDIA, RECYCLAGEM, HYPOTHESE,
HYPOGLYCEMIA, TYPOGRAPHIA, ESTEREOTYPO ou LINOTYPIA. Sempre chamo a
attenção para a differença entre as palavras HYPOTHESE e HIPPODROMO, que
os phoneticistas confundem na forma simplificada "HIPÓ..." mas que nossa
boa orthographia preserva. Abbaixo listo cem matrizes characteristicas
que integram um glossario mais completo, constante do meu DICCIONARIO
ORTHOGRAPHICO.


ABYSSO "precipicio" em ABYSSOPHOBIA, ABYSSAL
AMBLY "fracco", "molle" em AMBLYOPIA, AMBLYGONO
ARGYRO "prata" em ARGYROCRACIA, HYDRARGYROPHOBIA
BARY "pesado", "grave" em BARYPHONICO, BARYTONO
BATHY "profundo" em BATHYSPHERA, BATHYSCAPHO
BRACHY "curto" em BRACHYCEPHALO, BRACHYCARPO, BRACHYDACTYLO
BRADY "lento" em BRADYCARDIA, BRADYPHASIA
BUTYRO "manteiga" em BUTYROMETRO, BUTYRACEO
CALYPTO "coberto" em CALYPTOBRANCHIO, EUCALYPTO
CAMPYLO "curvo" em CAMPYLOTROPO, CAMPYLOPHYTO, CAMPYLOMORPHO
CHLAMYDO "manto", "involucro" em CHLAMYDOSPORIO, DICHLAMYDEO
CHRYSO "ouro" em CHRYSOGRAPHIA, CHRYSOSTOMO
CHYLO "succo" em CHYLOPHYLLO, CHYLOPHYTO
CHYMIO "liquido", "succo" em CHYMIOTHERAPIA, ALCHYMIA, CHYMICA
CLYSE [ou CLYSMO] "lavagem" em AUTOCLYSE, AUTOCLYSMO, HYSTEROCLYSE
CONCHYLIO "concha" em CONCHYLIOLOGIA, CONCHYLIOPHORO
CONDYLO "inchaço" em CONDYLOMATOSO, EPICONDYLIANO
CORYPHO "cume", "cymo" em CORYPHODONTE, CORYPHEU
COTYLO "cavidade", "vaso" em COTYLOPHORO, COTYLEDONE
CRYO "frio" em CRYOSTATO, CRYOPHOBIA [ou PSYCHRO]
CRYPTO "occulto" em CRYPTOGRAMMA, CRYPTOCOMMUNISTA, CRYPTONYMO
CYANO "azul" em CYANOCEPHALO, CYANICORNEO
CYCLO "redondo", "circular" em CYCLOTHYMICO, TRICYCLO [ou GYRO]
CYGNO "cysne" em CYGNOPHILIA, CYGNOPHOBIA
CYNO "cão" em CYNOCEPHALO, CYNOPHILO
CYSTO "bexiga", "bolha" em CYSTITE, FIBROCYSTO, CYSTICERCO
CYTO "cellula" em LEUCOCYTO, PHAGOCYTOSE
DACTYLO "dedo" em PTERODACTYLO, DACTYLOGRAPHIA
DIDYMO "duplo", "gemeo" em DIDYMOCARPO, PYGODIDYMO
DIPHYO "duplo" em DIPHYODONTE [ou DIDYMO]
DORY "arvore", "galho", "lança" em DORYOPTERO, DORYTOMO
DYNAMO "força", "potencia" em DYNAMOMETRO, DYNAMITE
DYS "falta", "difficuldade" em DYSLEXIA, DYSFUNCÇÃO, DYSPEPSIA
ELYTRO "involucro", "vagina" em ELYTRORRHAGIA, ELYTRITE
EMBRYO "feto" em EMBRYOLOGIA, EMBRYONARIO
ERYTHRO "vermelho" em ERYTHROCARPO, ERYTHROCYTO
ESPONDYLO "vertebra" em ESPONDYLOSE, ESPONDYLOZOARIO
ETYMO "verdadeiro", "certo" em ETYMOLOGIA, ETYMOGRAPHIA
EURY "largo", "extenso" em EURYCEPHALO, EURYCLIDES
GEPHYRO "atterro", "ponte" em GEPHYROPHOBIA
GLYCO "doce" em GLYCOSE, HYPOGLYCEMIA
GLYPHO "gravar", "entalhar" em HIEROGLYPHO, LITHOGLYPHIA
GONY "joelho" em GONYALGIA, GONYCELE
GRYPHO "rede", "malha" em LOGOGRYPHO, GRYPHAR
GYMNO "nudez" em GYMNOSPERMA, GYMNASTICA
GYNO [ou GYNECO] "mulher" em MISOGYNO, GYNECOLOGIA
GYPSO "gesso", "molde" em GYPSOGRAPHIA, GYPSIFERO
GYRO "circulo", "rotação" em GYROMANCIA, AUTOGYRO [ou CYCLO]
HYALO "vidro" em HYALOGRAPHIA, HYALOPHOBIA
HYDRO "agua" em HYDROMETRO, DESHYDRATAR [ou LYMPHO]
HYGIO "saudavel" em HYGIOLOGIA, HYGIENICO
HYGRO "molhado" em HYGROPHOBIA, HYGROMETRO
HYPER "accyma" em HYPERACIDEZ, HYPERBOLE, HYPERTENSÃO
HYPNO "somno" em HYPNOTISMO, HYPNOPHOBIA
HYPO "abbaixo" em HYPOCRITA, HYPOGASTRICO, HYPOTHESE
ICHTHYO "peixe" em ICHTHYOLOGO, ICHTHYOPHAGO
LARYNGO "garganta" em LARYNGOGRAPHIA, LARYNGOPHONIA
LYCO "lobo" em LYCOPODE, LYCANTHROPIA
LYMPHO "agua" em LYMPHORRHAGIA, LYMPHATICO [ou HYDRO]
MERYCO "ruminante" em MERYCOLOGIA, MERYCISMO
MOLYBDO "chumbo" em MOLYBDATO, MOLYBDENIO, MOLYBDOMANCIA
MYCO "fungo" em MYCOBACTERIA, MYCOSE
MYELO "medulla" em MYELOGRAMMA, MYELOMA
MYO "musculo" em MYOGRAPHIA, MYOCARDIO, MYALGIA
MYRIA "muitos" em MYRIAMETRO, MYRIAPODE
MYRMECO "formiga" em MYRMECOPHAGO, MYRMECOPHOBIA
MYTHO "fabula" em MYTHOLOGIA, MYTHOMANIA
NYCTO "noite" em NYCTOPHOBIA, NYCTURIA
NYMPHO "noiva" em NYMPHOMANIA, NYMPHOPHOBIA
ODYNIA [ou ODYNO] "dor" em ANODYNO, CRYMODYNIA
ONYCHO "unha" em ONYCHOMANCIA, ONYCHOPHAGIA
ONYMO "nome" em PSEUDONYMO, SYNONYMO
ORYZO "arroz" em ORYZOPHAGO [ou RYZI]
OXY "agudo", "acido" em OXYMORO, INOXYDAVEL
PACHY "espesso" em PACHYDERME, PACHYCEPHALO
PECHY "cotovello" em PECHYAGRA, PECHYALGIA
PHYLLO "folha" em PHYLLODENDRO, CHLOROPHYLLA
PHYSIO [ou PHYSE] "natureza", "character" em PHYSIOTHERAPICO, APOPHYSE
PHYTO "planta" em PHYTOCHYMICA, PHYTOTHERAPIA
PLATY "chato", "largo" em PLATYPODE, PLATYCEPHALO
POLY "numeroso" em POLYSEMIA, POLYTHEISMO, POLYSYLLABO
PORPHYRO "purpura" em PORPHYROLITHO, PORPHYRIO
PRESBY "velho", "senil" em PRESBYOPIA, PRESBYPHRENIA
PSYCHO "espirito", "mente" em PSYCHOPATHIA, PSYCHOSOMATICO
PSYCHRO "frio" em PSYCHROMETRO, PSYCHROPHOBO [ou CRYO]
PTYALO "saliva" em PTYALAGOGO, PTYALINA
PYGO "nadega", "trazeiro" em CALLIPYGIO, PYGODIDYMO
PYO "puz" em PYORRHAGIA, EMPYOSE
PYRO "fogo" em PYROTECHNICO, PYROMANIACO
RHYNCHO "bicco" em RHYNCHOCEPHALO, ORNITHORHYNCHO
RYZI "arroz" em RYZICULTOR [ou ORYZO]
SYM [ou SYN] "com", "juncto" em SYMPATHIA, SYNTONIA
TACHY "rapido" em TACHYGRAPHO, TACHYCARDIA
THYMO "emoção", "affectividade" em CYCLOTHYMICO, DYSTHYMICO
TYLO "callo" em TYLOSE, TYLOPODE
TYPHLO "cego" em TYPHLOGRAPHIA (Braille)
TYPO "marca", "impressão" em TYPOGRAPHIA, ESTEREOTYPO
TYRO "queijo" em TYROMANCIA, TYROPHAGO
XYLO "madeira" em XYLOGRAVURA, XYLOPHONE
ZYMO "fermento" em ZYMOTHERMIA, AZYMO, ENZYMA


Em summa, nem todo som de "I" em palavra de origem grega precisa levar
um "Y", mas os casos mais relevantes a gente accaba sabendo de cor:
APOCALYPSE tem, mas ECLIPSE não; POLYGRAPHO tem, mas POLITICO não;
ANEURYSMA tem, mas CHARISMA não; HYPOCRITA tem, mas HIPPOCRATES não;
PODOPHYLLO tem, mas PODOPHILO não; CYNOPHILO tem, mas CINEPHILO não;
TYRANNICO tem, mas TITANICO não; GYPSIFERO tem, mas CHIASTOLIFERO não,
lembrando que, neste ultimo exemplo, o pospositivo FERO é de origem
latina.


O importante é ter em mente que a quantidade de vocabulos desse typo é
muito menor que a de latinismos de uso corrente, o que significa maior
desempenho mnemonico em pouco tempo para quem ainda não tem a practica
diuturna da escripta etymologica. Nada, portanto, que desestimule um
orthographo principiante como o nosso Euclydes. Na proxima postagem
tractaremos do "PH".


Aos interessados deixo o link para um menu na nuvem donde podem baixar
os archivos do DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO e de outras obras pertinentes.


https://www.dropbox.com/sh/m8jq3615v16g2zt/AACEKn9GzBQUpQmyutQU6Bnha?dl=0


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sábado, 2 de abril de 2016

ABRIL/2016: ANTHROPOPHAGIA SIM, MAS COMMEDIMENTO NA COMIDA



Um internauta que, como eu, é fascinado por quaesquer opportunidades de
justificar o emprego de consoantes geminadas, questiona-me si, com base
nas formas italianas ALLEGRO ou COMMEDIA, não seria o caso de, por
analogia, adoptarmos taes geminações nos equivalentes portuguezes ALEGRE
e COMEDIA. E elle extende ao inglez sua hypothese, citando palavras como
MULATTO e TOBACCO, para propor que usemos lettras duplicadas nas formas
lusophonas MULATO e TABACO.


Para responder, tenho que ir por partes. O italiano é um idioma
historicamente mais phonetico que etymologico, como tantas vezes ja
lembrei. O facto de que na Italia existam verbos como APPLAUDIRE ou
SUPPLICARE, parentes directos dos nossos APPLAUDIR e SUPPLICAR, não nos
auctoriza a suppor que la elles preservem certas duplicações por amor à
etymologia. Os italianos tambem usam dois "LL" em ALLEGORIA, como nós,
mas não são os mesmos dois "LL" que utilizam na palavra ALLEGREZZA,
equivalente da nossa ALEGRIA, que, ao contrario de ALLEGORIA, não tem
origem grega e sim latina. Note-se que, alem dos dois "LL", a palavra
leva dois "ZZ", indicando uma funcção nitidamente prosodica e não uma
preoccupação propriamente orthographica. Para complicar um pouco as
coisas, reconhesço que, no nosso vernaculo, tambem se registra a forma
historica ALLEGRE, mas a origem tem a ver com ALACRIDADE e com o
adjectivo ALACRE, sempre com um só "L" nas fontes latinas. Voltando à
questão inicial, não é porque o italiano escreve REPUBLICA com dois "BB"
que vamos imitar tal practica, a qual é peculiar apenas àquella lingua.
Nossas bases etymologicas precisam ter um minimo de sustentação em
parallelismos com outros idiomas derivados do latim e do grego, como no
caso de vocabulos typo APPLAUSO, SUPPLICA ou ALLEGORIA, mas em casos
como COMEDIA (latim COMOEDIA) ou ALEGRE (latim ALACRIS/ALECRIS) não vejo
motivos para forçar a barra. Quanto às formas anglophonas MULATTO e
TOBACCO, a primeira vem do proprio portuguez, onde só leva um "T", e a
segunda do hespanhol, onde só é graphado com um "C". As duplicações "TT"
e "CC" vão, no caso, por compta dos mechanismos prosodicos do proprio
inglez. Acho que não seria o caso de, meramente por espirito imitativo,
seguirmos esses parametros. Sou o primeiro a suggerir geminações
plausiveis e fundamentadas, como em ABBRAÇO ou TORNOZELLO, mesmo quando
não accolhidas pelos lexicographos mais referenciaes, mas não posso
cahir em temptações appressadas. Sempre recommendo uma adveriguação
etymologica para cada palavra extrangeira que queiramos confrontar com
uma equivalente nossa. Como ninguem precisa ter em casa os principaes
diccionarios de cada idioma, a solução mais practica e technica dos
tempos actuaes é mesmo o cyberespaço, lembrando que, na internet, convem
quotejar duas ou mais fontes antes de tomar alguma informação por
fidedigna. Ao meu attento leitor, que ja se alegrava com uma comedia
mais feliz, suggiro que applaudamos as espectaculares scenas graphicas
deste nosso phantastico idioma e não suppliquemos que os philologos
approvem appropriações extranhas só por causa da belleza (e não da
BELLEZZA) das formas italianas. Calma, que o Brazil com "Z" sempre foi
nosso, antes de ser inglez...


Outro internauta, sciente da minha opinião liberal quanto ao
apportuguezamento de extrangeirismos, indaga-me accerca de certos
derivados do inglez. Pergunta elle: si temos, de ROCK, ROCKEIRO, como
seria o equivalente de RAP, RAPEIRO ou RAPPEIRO? O proprio ROCKEIRO
poderia ser ROQUEIRO? E o MARKETEIRO, poderia ser MARQUETEIRO? E o verbo
ESCANNEAR, deveria ser ESCANEAR? E os verbos XEROCAR e SAMPLEAR? Quer
que eu opine sobre tudo isso e faça um appanhado.


Então vejamos. Em principio, defendo a liberdade de excolha do escriptor
quanto à adopção do anglicismo original ou duma forma apportuguezada. Ja
fiz algumas resalvas para certos casos com os quaes implico, como o
injustificavel termo HASHTAG, mas tirando as idiosyncrasias não sou de
xenophobias linguisticas. Assim, para mim tanto faz escrevermos SPORT ou
STRESS como SPORT ou ESTRESSE. Nada de problematico, portanto, quanto a
derivados como ESPORTISTA [ESPORT(E)+ISTA] ou ESTRESSAR [ESTRESS(E)+AR],
ja que o "miolo" original permanesce intacto. No caso de ROCK+EIRO,
prefiro manter o digramma "CK" e grapho ROCKEIRO em vez de ROQUEIRO. No
caso de RAP+EIRO, prefiro RAPEIRO mesmo e não RAPPEIRO (de RAPPER).
Entre MARKETEIRO e MARQUETEIRO, prefiro com "K", mais fiel ao original
MARKETING. De SCANNER e SAMPLER acho natural que derivem os verbos
ESCANNEAR e SAMPLEAR. Até de XEROX acceito XEROCAR, mais como um
colloquialismo, uma vez que ficaria extranhissimo usar XEROXAR. Em
geral, evito mexer nos infixos ou "miolos" dos anglicismos, liberando o
emprego apportuguezado dos suffixos typo "AR", "EIRO" ou "ISTA". Assim,
grapho normalmente termos como:


ATTACHAR [ATTACH+AR], que tem optima opção vernacula em ANNEXAR
BULLYINGAR [BULLYING+AR]
CHECKAR [CHECK+AR], ja popularizado tambem como CHECAR
CLICKAR [CLICK+AR], ja popularizado tambem como CLICAR
COPYDESKAR [COPYDESK+AR]
CUSTOMIZAR [CUSTOM+(IZ)AR]
DRIBBLAR [DRIBBL(E)+AR]
HACKEAR [HACKE(R)+AR]
PLUGAR [PLUG+AR]
PRINTAR [PRINT+AR]
TWITAR [TWIT+AR]
ZAPEAR [ZAP+(E)AR]
BASKETEIRO [BASKET+EIRO]
BLOGUEIRO [BLOG+(U)EIRO] em vez de BLOGGUEIRO
DOGUEIRO [(HOT)DOG+(U)EIRO]
DOLLEIRO [DOLL(AR)+EIRO]
FUNKEIRO [FUNK+EIRO]
TWITEIRO [TWIT+EIRO], em vez de TWITTEIRO (de TWITTER)
BONDAGISTA [BONDAG(E)+ISTA]
GOLFISTA [GOLF+ISTA]
JAZZISTA [JAZZ+ISTA]
SKATISTA [SKAT(E)+ISTA]
SURFISTA [SURF+ISTA]
TENNISTA [TENNIS+(IS)TA]


Para illustrar o assumpto, transcrevo entre chaves o topico respectivo
no MANUAL ORTHOGRAPHICO BRAZILEIRO de Julio Nogueira, lembrando que, na
decada de 1920, muitos termos hoje totalmente apportuguezados ainda eram
novidade, emquanto os termos mais technologicos actuaes nem existiam ou
siquer tinham uso corrente. Nogueira basicamente reaffirma a tendencia
mais generalizada de admittir os anglicismos quando não haja exacta
equivalencia no vocabulario vernaculo. Nessa linha, concordo que é mais
razoavel preservar a forma original do que "forçar a barra" em
apportuguezamentos imitativos apenas da pronuncia, como DESAINE ou
DAULOUDE em logar de DESIGN ou DOWNLOAD.


{É impossivel estabelescer um criterio uniforme no tractamento das
palavras extranhas à lingua e que nella se fixaram. O caturrismo
implacavel mas innocuo de certos professores ou suppostos arbitros da
lingua tem querido vestir estas palavras de roupagens vernaculas,
affeiçoando-as systematicamente aos moldes e ao genio da lingua
portugueza. Esse proposito de nacionalização não medra e os emprestimos
das linguas extrangeiras continuam a seguir vario destino, ora
adjeitando-se a nossa phonologia, e representação graphica, ora
conservando-se intactos no seu aspecto nativo. Um observador imparcial
desse phenomeno reconhescerá nelle as mesmas duplicidades, as mesmas
incoherencias de outros phenomenos da linguagem e um codigo sensato não
pode ter outro intuito sinão registrar os factos, submisso às injuncções
populares e às correntes vencedoras, que tudo suffocam e submettem. O
futuro codigo orthographico da lingua tem, pois, de considerar duas
classes de palavras extrangeiras: [I] a constituida pelas que conservam
a sua morphologia intacta e pronunciamos ou tentamos pronunciar como nas
linguas de origem, taes sejam: AVALANCHE, BEEF-STEAK, BILL, BONNET,
BOUQUET, BOX, BREAK, BULL-DOG, CHAMPAGNE, CHAUFFEUR, CLOWN, CLUB, COKE,
CRAYON, CROQUETTE, CRUP, CUTTER, DOLLAR, ÉLITE, ENVELOPPE, FOOT-BALL,
GIM, GRENAT, GROG, GROOM, HIGH-LIFE, KIRSCHE, LAVABO, LUNCH, MADAME,
MARQUISE, MASSACRE, MATINÉE, MAYONNAISE, MEETING, MÉNAGE, NICKEL,
NUANCE, PALETOT, PICK-POCKET, PIC-NIC, ROBE, ROAST-BEEF, REPORTER, RHUM,
SCOUT, SOIRÉE, SPLEEN, SPORT, STEAPLE-CHASE, THALER, THALWEG, TOAST,
TOILETTE, TOURNÉE, TUNNEL, TURF, WHISKY. [II] a das palavras que
soffreram modificações mais ou menos profundas na sua morphologia e que
pronunciamos com variantes prosodicas mais ou menos appreciaveis, taes
como: BAIONNETA, BEBÊ, CHEQUE, CROQUE, DIQUE, DUCHA, ECLUSA, ETAPA,
FELDSPATHO, PUDDIM, QUARTZO, REDINGOTE, RICOCHETE, SUTACHE, TRENÓ,
TURISTA, VAGÃO, VALSA, VINHETA, ZUAVO. Em que pese aos irreductiveis
puristas, que num trabalho vão, tentam embargar-lhes o passo ou propõem
substituições artificiaes e inviaveis, esses emprestimos representam
contribuição appreciavel da linguagem portugueza. É preciso, pois, saber
qual deve ser a sua graphia, sejam adaptações, sejam formas puras de
idiomas extrangeiros. No glossario com que rematamos o presente ensaio
orthographico nada mais fazemos do que registrar essas palavras na sua
forma definitiva e mais generalizada. Incluimos apenas os
extrangeirismos com que ja nos achamos familiarizados, os de uso
incontestavel e que ja se tornaram, por assim dizer, necessarios aos
nossos habitos.}


Observo que o glossario a que Nogueira allude é o que consta de seu
MANUAL e não corresponde necessariamente ao criterio que adopto ao
verbetar alguns extrangeirismos em meu proprio diccionario.


Aos interessados deixo o link para um menu na nuvem donde podem baixar
os archivos do DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO e de outras obras pertinentes.


https://www.dropbox.com/sh/m8jq3615v16g2zt/AACEKn9GzBQUpQmyutQU6Bnha?dl=0


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