sábado, 29 de abril de 2017

MAIO/2017: BIODIVERSIDADES DO SYSTEMA ECORTHOGRAPHICO


Nunca me canso de dizer que a orthographia é o patrimonio ambiental da
falla. Por isso, a exemplo dos ecologistas que tanto battalham pelos
biomas e topomas do systema terraqueo, eu battalho pelo graphoma dos
graphemas e acho cada "PH", cada "Y", cada lettra dupla um monumento ou
especimen a ser preservado, tal como uma egreja barroca em Minas, um
sobrado em Salvador ou uma arara na matta tropical, equivalendo a uma
cathedral gothica ou uma arena romana na Europa. Mas ha casos em que,
mesmo mantendo a tradição escripta, temos de admittir que a graphia de
certas palavras é mais simples do que a physiognomia do morphema pode
suggerir. As perguntas de alguns consulentes evidenciam essa apparente
"necessidade" de complexidade que, entretanto, não se verifica. Vejamos.


Um leitor questiona: si COMMISSÃO e COMMITTÊ levam geminações, por que
COMICHÃO, COMITIVA e COMICIO não levam?


Respondendo: o etymologismo verbal latino MITTERE é um dos mais
prolificos em derivações vernaculas, tanto no graphema METTER como no
graphema MITTIR. Assim, temos ADMITTIR e ADMISSÃO, COMMETTER e
COMMISSÃO, DEMITTIR e DEMISSÃO, EMITTIR e EMISSÃO, IMMITTIR e IMMISSÃO,
OMMITTIR e OMMISSÃO, PROMETTER, PROMISSÃO e PROMESSA, REMETTER, REMISSÃO e REMESSA, SUBMETTER e SUBMISSÃO ou TRANSMITTIR e TRANSMISSÃO. A palavra COMMITTÊ tambem tem essa origem. Ja COMICHÃO vem de COMESTIONE (segundo o Aurelio), emquanto o Aulete e o Lello esclarescem que deriva simplesmente do verbo COMER, como COMEÇÃO ou COMILANÇA. Quanto a COMITIVA, vem assim do latim (de COMES/COMITIS) e COMICIO do latim COMITIUM. Nesses casos, só nos resta memorizar cada uma para evitar confusões, particularmente no caso politico dum committê que organiza um
comicio ou duma commissão parlamentar que investiga os gastos de alguma comitiva...


Outro questiona: si HYSTERIA, AMPHITRYÃO e HYPERTENSÃO levam "Y", por
que HISTRIÃO e HIBERNAÇÃO não levam?


Respondendo: os exemplos com "Y" são hellenismos, excepto HYPERTENSÃO,
um hybridismo onde HYPER vem do grego. Ja HISTRIÃO vem do latim HISTRIO,
que tambem deu o adjectivo HISTRIONICUS, emquanto HIBERNAÇÃO vem de
HIBERNATIO, de HIBERNUM. Dahi o motivo pelo qual tambem HINVERNO deve
levar "H". Portanto, uma pessoa hysterica pode ser histrionica, mas não
em tudo.


Outro questiona: si SUMMA e SUMMULA, que envolvem a noção de synthese,
levam "M" geminado, por que a palavra RESUMO, de egual forma e sentido,
não leva?


Respondendo: SUMMA, SUMMULA, SUMMARIO chegam assim do latim e não cabe
contestação. Ja o graphema SUMIR (do latim SUMERE), que participa de
verbos como ASSUMIR, CONSUMIR e PRESUMIR, não se confunde com o primeiro
caso, lembrando que o verbo SUMIR, no sentido de desapparescer, tambem
vem de SUMERE. Parallelamente ao verbo CONSUMIR, é o verbo CONSUMMAR que
tem, este sim, a ver com SUMMA, pois envolve a idéa de algo accabado no
sentido de completo, emquanto CONSUMIR envolve a idéa de algo accabado
no sentido de esvaziado. Para exemplificar, posso dizer que, num
restaurante, eu CONSUMMO (satisfaço, realizo) meu prazer gastronomico
mas para isso CONSUMO (gasto, esbanjo) toda a minha grana, ou, por
outra, meu prazer se CONSUMMA mas CONSOME meus recursos. Paresce subtil,
mas são coisas do proprio latim.


Outro questiona: si BACCHANAL tem a ver com Baccho, o adjectivo BACANA
tambem não teria? E o adjectivo SAFADO, não teria a ver com SAPPHO?


Respondendo: segundo os etymologistas, BACANA é motivo de divergencias
entre o argentinismo hespanhol e o italianismo, mas teria a ver com
BACANO, possivelmente do italiano BACCANO, que teria a ver com
BACCHANTE. Logo, não seria exaggero affirmar que BACANA poderia ser
graphado como BACCHANA e que o escriptor decide. Quanto a SAFADO, do
verbo SAFAR(-SE), equivale ao participio SAFO, que tambem é objecto de
divergencia entre uma extranha origem arabe e uma ainda mais extranha,
ingleza: o adjectivo SAFE, no sentido de excappo ou a salvo. Ora, como a
noção de SAFADEZA equivale à de SACANAGEM, ha quem sustente que o
sentido de SAFO tem, sim, a ver com a poetiza grega SAPPHO, pelo facto
de ser lesbica e, na concepção vulgar, despudorada e pornographica. Dahi
se deprehende que graphar SAFADO como SAPPHADO não seria de todo
improprio, justamente pelo sentido improprio aos bons costumes... Mas
ainda ha quem diga que SAFADO vem de SAFARDANA ou SAPHARDAMNA, que por
sua vez viria duma mixtura das palavras SEPHARDITA e DAMNAR, mas,
descomptado o factor pejorativo e preconceituoso contra os judeus, tal
hypothese paresce um tanto forçada. Em todo caso, um "PH" nessa palavra
não pode ser deschartado como alternativa plausivel.


Por fim, outro questiona si o verbo AFOBAR não teria a ver com PHOBIA,
caso em que se escreveria com "PH".


Respondendo, consta dos diccionarios que AFOBAR tem "origem obscura",
expressão usada quando querem tirar o cu da recta, em bom portuguez.
Claro que ha explicações para qualquer vocabulo, ainda que
controvertidas. Uma dellas é que seria uma hyperthese de ABBOFAR, de
BOFE, suggerindo que a pessoa abbofada (ou esbofada, ou esbaforida)
estaria botando os bofes pela bocca, ou seja, appressando-se,
affligindo-se. Tambem as noções onomatopaicas de BAFO e de BUFAR podem
entrar nessas interpretações. Si prevalescesse a these de BOFAR com
troca de consoantes para FOBAR, é logico que o prefixo "AD", ao entrar
em scena, geraria o verbo AFFOBAR, com geminação do "F". Mas as
possiveis explicações não param por ahi. Tambem ja encontrei aquelloutra
de que alguem admedrontado ou appavorado poderia se appressar ou se
precipitar, dahi o sentido de PHOBIA associado à soffreguidão, caso em
que o prefixo latino "AD", assimilado pelo infixo grego PHOBO, geraria
um raro hybridismo em APPHOBAR, onde o "P" se geminaria, como o "C" em
ACCHATAR. Mas a decisão de acceitar tal hypothese fica a cargo do
orthographo, ou do ecorthographo, caso o subjeito se conscientize de que
o ambientalismo linguistico se extende aos mais exoticos especimens de
"PH" a serem preservados da extincção, ou do desuso.


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sábado, 25 de março de 2017

ABRIL/2017: QUESTOENS DE ACCENTUAÇAM NA DIPHTHONGAÇAM ANNASALADA


Uma questão que sempre volta à superficie e fluctua ao sabor das marés
grammaticaes é o emprego do til. A proposito da minha proposta de
"minima accentuação", caberia um addendo ao topico [4.3] do meu
DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO, à luz das considerações levantadas pelo
attento leitor Alexandre Pires, adepto da abolição do til em favor da
corrente que graphava CAMOENS ou ALPHONSUS DE GUIMARAENS. Em principio,
seria essa uma tendencia a ser levada em compta por aquelles que não
perderiam opportunidade de dispensar mais um signalzinho incommodo,
especialmente na era digital. Antes de equacionar a questão para
chegarmos ao referido addendo, vou transcrever algo que normatizava
Julio Nogueira em seu MANUAL ORTHOGRAPHICO BRAZILEIRO, quanto ao
diphthongo "ÃO".


{A graphia "ÃO" é sempre final da palavra ou do seu radical: PAIXÃO,
SAYÃO, JAPÃO, PÃO, CÃO e CÃOZINHO, etc. [...] Nas formas verbaes em que
o diphthongo final é tonico escreve-se "ÃO", como em: VÃO, SERÃO, DÃO,
FARÃO, SÃO, ESTÃO, DIRÃO etc. Nas em que elle é atono a escripta é "AM":
FORAM, ERAM, DERAM, DISSERAM, etc. O diphthongo "ÃO", tonico ou atono,
ja se escreveu com o til na subjunctiva. Era esta a forma commum de
Duarte Nunes do Lião, na sua "Orthographia". Este mesmo auctor escrevia
"AM", a par de "ÃO". O Sr. Ribeiro de Vasconcellos, modernamente, na sua
grammatica, usa das formas SAM, DAM, ESTAM, a par de NÃO. Camões
escreveu o diphthongo "AM":


"Fuy capitam do mar por onde andaua" (...)
"Onde imaginaçoens mais certas sam" (...)
"De seu officio & sangue a obrigaçam"


Mas tambem escreveu "ÃO":


"Que cada Região produze e cria"


As duas formas apparescem alternadas no seguinte disticho:


"Deixa intentado a humana geraçam:
Misera sorte, extranha condição" (L. IV, 104)


A escripta deste diphthongo é mais um facto proprio do genio da lingua
que um resultado de mutações morphologicas, pois apparesce com uma forma
convergente de innumeras fontes. Em SÃO e VÃO (nomes) é uma transcripção
popular de "ANU" (SANU, VANU); em SÃO e VÃO (verbos) representa a
terminação "UNT" ou "ADUNT" (SUNT, VADUNT); em PÃO, CÃO corresponde à
final "ANE"; em formas verbaes como DÃO, ESTÃO tem por antecedente a
terminação "ANT": DANT, STANT; em linguagens do futuro: AMARÃO, SERÃO,
PARTIRÃO, PORÃO o diphthongo não é mais que a terceira pessoa do plural
do indicativo de HAVER na forma anteclassica, despida do "H" etymologico
"-ÃO". Assim, o melhor é estabelescer preceitos meramente practicos.}


Divergindo de Nogueira em alguns ponctos, grammaticos como Eduardo
Carlos Pereira concordavam, basicamente, no seguinte:


1 - Escrever "ÃO" no final de palavra aguda ou de raiz de palavra aguda
que entre na formação de derivações: CÃO, CÃOZINHO.


2 - Escrever "AM" no final de certos nomes não agudos, sem necessidade
de auxiliar a pronuncia com o accento inconveniente na tonica da
palavra: ORGAM, ORPHAM, BENÇAM, RHABAM, SOTAM, ESTEVAM, CHRISTOVAM, etc.


3 - Escrever "AM" no final de formas verbaes não agudas: FORAM, ERAM,
SERIAM etc.


Caso optassemos pela abolição do til tambem nas formas oxytonas,
teriamos que resolver determinadas pendencias, a saber:


1 - Si, em logar de CÃO, grapharmos CAM, como ficaria o plural,
inclusive do diminutivo e augmentativo? Segundo a escripta camoneana, o
plural seria CAENS. Segundo a regra nogueiriana, o diminutivo seria
CANZINHO, mas o plural CAENSINHOS. Quanto ao augmentativo, CANZARRÃO,
CANZARROENS.


2 - Si, em logar de MÃO, graphassemos MAM, o plural seria MANS? E as
formas diminutiva e augmentativa? MANZINHA e MANZONA? Si, em logar de
MÃE, graphassemos MAEM, teriamos MAENS e MAENZINHAS?


3 - Si, alem da forma feminina CHRISTAN, graphassemos a forma masculina
como CHRISTAM em logar de CHRISTÃO, como ficariam os pluraes e
diminutivos? Teriam que ser homographos, CHRISTANS, ao lado de
CHRISTANZINHOS e CHRISTANZINHAS?


4 - Si, em logar das formas substantivas BOTÃO, CAGÃO, CHORÃO, COLHÃO,
FUJÃO, MIJÃO, PAPPÃO ou PENSÃO, graphassemos o diphthongo como "AM",
teriamos que accentuar as formas verbaes homographas BOTAM (BOTAR),
CAGAM (CAGAR), CHORAM (CHORAR), COLHAM (COLHER), FUJAM (FUGIR), MIJAM
(MIJAR), PAPPAM (PAPPAR) e PENSAM (PENSAR)? Não seria um inconveniente
emprego de agudos e circumflexos para marcar os paroxytonos BÓTAM,
CÁGAM, CHÓRAM, CÔLHAM, FÚJAM, MÍJAM, PÁPPAM e PÊNSAM?


5 - Si, em logar de PÕE, COMPÕE, EXPÕE, OPPÕE, SUPPÕE e outras formas
verbaes da terceira pessoa do singular, graphassemos POEM, COMPOEM,
EXPOEM, OPPOEM e SUPPOEM, como ficariam as formas da terceira pessoa do
plural? Teriamos, neste caso, de conviver com uma incommoda e confusa
homographia.


6 - Si, em logar de AMARÃO e VENDERÃO, graphassemos as formas futuras
como AMARAM e VENDERAM, não se crearia uma perigosa homographia com as
formas preteritas? Não seria incoherente com a minima accentuação
recorrermos a um accento agudo ou circumflexo para compensar o til
dispensado nestas formas preteritas, AMÁRAM, VENDÊRAM? Talvez não, si
considerassemos que a quantidade de vocabulos verbaes seria muito menor
que aquellas oxytonas todas dispensadas do til. Uma relação de
custo/beneficio a ser levada em compta.


7 - Si, em logar de "ÃO", grapharmos "AM", restaria intacta uma
ambiguidade em relação ao graphema "ON", predominante nas formas
derivadas. Emquanto nomes como ADAM, ABRAHAM, SEBASTIAM ou SAM BENEDICTO
geram adjectivos em "A" como ADAMICO, ABRAHAMICO, SEBASTIANISTA e
SAMBENEDICTENSE, outros como AARAM, SIMAM e SALOMAM geram adjectivos em
"O" como AARONICO, SIMONENSE e SALOMONICO. A tendencia será maior em
direcção à vogal "O", como em CAMPEAM/CAMPEONATO, LEAM/LEONINO,
HISTRIAM/HISTRIONICO ou TABELLIAM/TABELLIONATO, mais conforme ao plural
em "O", como em CAMPEOENS, LEOENS e HISTRIOENS, predominante no
portuguez, a par de TABELLIAENS. Nada, porem, que não se accommode aos
habitos do escriptor.


Assim sendo, o melhor é deixar a criterio de cada orthographo a decisão
de manter ou abolir o til. Pessoalmente, prefiro mantel-o para evitar
maiores conflictos, mas estou accrescentando as formas alternativas ao
DICCIONARIO, para registrar meu reconhescimento à contribuição de
leitores como Alexandre Pires. Até a proxima!


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MARÇO/2017: FALSOS AMIGOS HESPANHOES E ITALIANOS


Para aquelles que acham o hespanhol muito apparentado ao portuguez, ou
que recorrem ao "portunhol" como si fosse sufficiente para um reciproco
entendimento, suggiro a traducção do seguinte paragrapho.


Allá viene un tarado pelado con su saco en las manos corriendo atrás de la
buseta. La perdió y quedó dando puñetazos al aire.


O sentido correcto nada tem de chulo nem obsceno, ao contrario do que
pode parescer:


Lá vem um doido careca com seu paletó nas mãos correndo attraz do
microomnibus. Perdeu-o e ficou dando socos ao ar.


Essa pegadinha de estudantes pode illustrar algo mais que uma armadilha
idiomatica. Tambem nas questões orthographicas é preciso tomar cuidado
com as analogias. Não é porque "nuestros hermanos" usam um "H" que
podemos ir graphando IRMÃO com essa inicial, nem porque escrevem
"español" que vamos tirar o "H" de HESPANHOL. Vale sempre conferir a
matriz latina, levando-se em compta a propria tradição lusophona.


Um problema que passa despercebido à maioria dos orthographos é que os
auctores de diccionarios são tendenciosos e capciosos quando
compromettidos com o phoneticismo. No intuito de "empurrar" a
simplificação reformista, escamoteiam matrizes etymologicas e dão
hespanholismos ou italianismos como "origem", a fim de desviar a
attenção do consulente. Cito os casos de AFFICCIONADO, TERTULLIA,
HARPEJO e EXTORNO.


AFFICCIONADO, segundo os lexicographos, vem do hespanhol AFICIONADO,
como si isso bastasse para nos obrigar a fazer de compta que não
preexistem o prefixo latino "AD" e o substantivo FEIÇÃO, alem de formas
correlatas como AFFECTO e AFFECÇÃO, ao lado de AFFEIÇÃO. Por mais que a
especificidade do significado seja hispanica, orthographicamente o que
deve valer é a morphologia tradicional na hora de apportuguezarmos o
vocabulo, evidentemente. O mais vernaculo seria AFFECCIONADO, mas
admitte-se o "I" pelo "E" para characterizar uma accepção menos
physiologica que psychologica. A proposito, a palavra PSYCHOLOGIA é
exemplo gritante de como o phoneticismo não pode servir de parametro
para qualquer reforma, pois em hespanhol virou SICOLOGÍA, forma que,
alem de absurda, induz à confusão com SYCOLOGIA, que em portuguez
significa o estudo dos figos, devido ao etymo grego SYCO.


TERTULLIA apparesce nos diccionarios como sendo de origem castelhana,
dahi levar um só "L". Mentira. O significado da palavra pode ter sido
concebido naquelle idioma, mas a palavra em si tem obvia origem no nome
do ecclesiastico catholico Tertulliano, donde o termo TERTULLIANISMO.
Ora, fica claro que, num portuguez que se queira etymologico, TERTULLIA
tem de levar "L" duplo, e fim de pappo.


HARPEJO, obvia derivação de HARPA, apparesce em varios diccionarios como
ARPEJO, só porque existe ARPEGGIO no italiano. Ora, é claro que, no
sentido technicamente musical, a origem immediata é italiana, mas a
origem remota é que deve prevalescer neste caso.


EXTORNO, por sua vez, vem allegadamente do italiano STORNO, pretexto
para que alguns lexicographos desrecommendem o "X". Outro caso em que,
si a accepção especificamente financeira pode ser a italiana, a
morphologia e a semantica exigem o prefixo "EX" latino, ao contrario do
café ESPRESSO, onde o "S" é necessario para differenciar de EXPRESSO, ja
que o sentido não é o dum preparo rapido e sim dum resultado obtido sob
pressão.


Ainda no terreno das distincções necessarias, approveito para lembrar
que GRAFFITE não é o mesmo que GRAPHITE, dahi a acceitação do
italianismo GRAFFITTI, para differenciar, no minimo, um lapis dum
spray...


Isto dicto, vou parando por aqui e volto em breve. Até!


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MARÇO/2017: QUANDO "CORRECTOR" É CORRIGIDO PARA "CORRETOR"



Ultimamente tenho recebido poucas mensagens de consulentes, mas copio
abbaixo algumas interessantes às quaes respondi pelo email que utilizo:
mattosog@gmail.com


Alexandre Pires observou que meu DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO não
assignalava a differença entre CORRECTOR (aquelle ou aquillo que
corrige) e CORRETOR (que faz corretagem), ja que CORRIGIR e CORRETAR
teem etymos distinctos.


Bem observado, Alexandre. Lembro-me de ter attentado para a questão na
epocha em que elaborava este blog, CORRECTOR ORTHOGRAPHICO, mas faltou a
resalva no diccionario, que estou providenciando. O curioso era que
alguns orthographos admittiam só a graphia CORRECTOR, como si a
intermediação commercial presuppuzesse um accerto ou negocio
justo/correcto, desconsiderando que a CORRETAGEM vem de CORRER (como em
"moeda corrente") e não de CORRIGIR. Eu mesmo posso ter escripto errado
em algum momento, ainda que a accepção CORRETOR seja de uso mais
restricto a uma profissão.


Kayky Macedo estava em duvida sobre a origem e a graphia de seu prenome.


Caro Kayky, seu prenome pode ser escripto de qualquer maneira, como você
mesmo demonstra, ja que não tem origem formal no portuguez ou em
qualquer idioma amerindio. Na verdade, tracta-se de uma confusão que
tambem occorre com diversos outros hypocoristicos transformados em
prenomes, taes como Cadu (de Carlos Eduardo), Cabé (de Carlos Alberto),
Joca (de João Carlos) ou Zeca (de José Carlos): como não são formas
officiaes, accabam surgindo graphias typo KADU, KABÉ, JOCA ou ZEKA,
quando alguem resolve baptizar "creativamente" um filho. No seu caso,
seria a forma abbreviada de Carlos Henrique, appellido que virou moda em
algum momento (talvez por causa duma telenovella) e, com o tempo, passou
a ser graphado como identicos modismos "indigenas" typo Kauê ou Kauan.
Nada pessoal contra, meu caro, mas nos States seu nome teria pronuncia
totalmente diversa e, mesmo aqui, sempre suscitaria divergencias. O
importante é estarmos satisfeitos com nossos nomes, não é?


Vera Guimarães perguntou duas coisas: o motivo de escrevermos APPETITE
com "P" duplo e APERITIVO com "P" simples, bem como o motivo de
escrevermos AIPO com "I" e AYPIM com "Y".


Simples, Vera. APPETITE vem do latim APPETITUS, mas aquillo que abre o
appetite é APERITIVO porque "abrir" vem do latim APERIRE. Ja AIPO vem do
latim APIUM, emquanto AYPIM vem do tupy. Não são, portanto, cognatos,
como pode parescer.


Wilson Borges, a proposito das tornozelleiras electronicas tão em voga,
perguntou por que a maioria dos orthographos escreve TORNOZELLO com um
só "L" e COTOVELLO com dois. Elle tambem quiz saber por que escrevo
ESCANTHEIO quando me refiro à cobrança dum "corner" no futebol.


Wilson, transcrevo a resposta que ja dei neste blog. Todos os
diccionarios registravam COTOVELLO com "L" duplo mas simplificavam o "L"
de TORNOZELO, talvez devido ao latinismo da primeira
(CUBITUS/CUBITELLUS) e ao hellenismo da segunda (TORNOS+OZOS),
theoricamente insufficiente para explicar a desinencia latina "ELLO".
Por analogia, poderiamos admittir o graphema "ELLO" para ambas, sem
grande violencia contra a tradição vernacula, como no caso de CABELLO e
PELLO (respectivamente, CAPILLUS e PILUS, mas tambem PILLUS); acho,
porem, que a materia deve ficar a criterio de cada escriptor. Quanto ao
termo ESCANTHEIO, tracta-se de simples derivação. Ha differença entre
CANTO (no sentido musical, do latim CANTUS) e CANTHO (no sentido
espacial, do latim CANTHUS), donde o tiro de cantho ter de ser escripto
com "TH", dahi ESCANTHEIO. O mesmo vale para CANTHONEIRA, ACCANTHONAR e
outros derivados.


Lucas Barbosa indagou si não seria preferivel escrever EFFECTO e DOCTOR,
a exemplo do inglez, ja que seriam formas mais proximas da matriz
etymologica que EFFEITO e DOUTOR.


Não, Lucas, tem de ser DOUTOR mesmo e não DOCTOR. Guarde estas duas
dicas basicas e você vae evitar divagações linguisticas:


Primeira: a orthographia etymologica não mexe em consoantes que viraram
vogaes, como em DOUTOR e OUTUBRO ao lado de OITAVO e NOITE, nem em
vogaes que se transformam, como em OURO e AUREO, BOCCA e BUCCAL. Ella só
corrige a escripta em caso de consoantes mudas (AUCTOR, ELECTRICO),
duplicadas (COMMERCIO, LITTERATURA) ou digrammaticas (PHILOSOPHIA,
CHYMICA, MATHEMATICA), ou seja, deixa à phonetica o que é pronunciado e
exige da tradição o que é escripto, embora nem sempre coincida a
pronuncia com a escripta, como em EGUAL/EGUAES, CREANÇA, LOGAR ou
MOLEQUE.


Segunda: o inglez não serve como regra, só como parametro consonantal,
como em COMMERCIO, SCIENCIA, PHYSIOLOGIA ou PSYCHOLOGIA. Mas, seja em
caso de consoantes ou vogaes, é preciso cuidado com outros idiomas, como
em AUCTOR, LITTERATURA, PHANTASIA, PAROLYMPICO ou OCTOGONO, que elles
escrevem errado: AUTHOR, LITERATURE, FANTASY, PARALYMPIC, OCTAGON.

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quarta-feira, 30 de novembro de 2016

DEZEMBRO/2016: UM FREGUEZ FALLAZ QUE FAZ JUS AO BIS


No mez passado abbordei o caso dos graphemas "AU" e "ÁO" e, para fazer
um parallelo, mencionei minha coherencia com o principio da minima
accentuação. Citei LUIZ e PORTUGUEZ como exemplos do quanto a
orthographia preservacionista prescinde do accento agudo. Tambem alludi
ao facto de que os leitores deste bloguinho são attentos observadores,
promptos para me pegar no pullo, ou pelo menos para tentar pegar-me.


Agora é o leitor Oswaldo quem me interpella:


- Você defende as terminações com a lettra "Z" para não ter de escrever
LUIZ como LUÍS, mas escreve ASSIS e PARIS. Como explica mais essa
incoherencia?


Explico-a porque a incoherencia não é minha. A orthographia não é uma
sciencia exacta, cabendo excepções a quaesquer regras, ou antes,
convenções que recommendo sem tentar impor. ASSIS e PARIS são formas que
difficilmente alguem achará como ASSIZ e PARIZ, embora o proprio Julio
Nogueira admitta PARIZ. Vejamos o que elle diz em seu MANUAL
ORTHOGRAPHICO BRAZILEIRO e depois accrescentarei meus commentarios.


{A constricta "ZÊ" representa-se por "Z": [...] como lettra final de
grande numero de palavras agudas e nos seus pluraes e derivados: GAZ,
PAZ, RAPAZ, TIMIDEZ, FRANCEZ, PORTUGUEZ, VEZ, AUDAZ, LIZ, RAIZ, NARIZ,
PAIZ, JUIZ, PARIZ, NOZ, VOZ, FEROZ, ATROZ, LUZ, CRUZ. Esta indicação de
cunho practico appoia-se no facto de ser o "Z", em innumeros casos, a
transcripção de um "C" latino. Os derivados de formação popular manteem
a mesma graphia: RAPAZIADA, FRANCEZMENTE, ENRAIZAR, JUIZADO, VOZEIO,
VOZEAR, FEROZMENTE, LUZEIRO, CRUZAR, CRUZEIRO, etc.}


Obviamente, Nogueira faz suas excepções, como JUS, JESUS, MOYSÉS,
CAIPHÁS, que eu também levo em compta, mas o facto é que a etymologia e
a tradição escripta não são sufficientes para estabelescer um paradigma
para todos os casos. Graphamos SATANAZ mas temos escrupulo de graphar
CAIPHAZ ou JESUZ. Por que? A resposta talvez esteja justamente na praxe
consuetudinaria. Basta consultar as fontes lexicographicas. O
diccionario Lello consigna SATANAZ com "Z" ao lado de CAIPHÁS com "S",
bem como ASSIS e PARIS. O de Aulete, como não é encyclopedico, só
registra adjectivos de nomes proprios, mas não verbeta PARISIENSE e em
FRANCISCANO não menciona "de Assis"; comtudo, no verbete JACOBINO
menciona PARIS com "S". Outrosim, nosso Assis mais famoso, o Machado,
não usava "Z", emquanto Delphino, que era Luiz, não usava "S". Está ahi
a differença da praxe, diaphana e crystallina.


Em summa, ninguem precisa ter dor na consciencia si se vê às voltas com
taes incoherencias, pois ellas fazem parte do complexo universo lexico
do idioma, para o qual nenhuma academia tem poderes de legislar em
character obrigatorio.


ASSIS vem do italiano ASSISI e PARIS não do grego mythologico PARIS (que
é paroxytono e accentuado como PÁRIS pela graphia phonetica), mas da
tribu celta PARISII. Em todo caso, paresce claro que os nomes proprios
teem sua peculiar morphologia e nem sempre podem ser enquadrados pelos
mesmos criterios que regem os substantivos communs do typo agudamente
terminado em "Z" de modo a dispensar o accento. Mesmo entre estes ha
necessidade de distinguir NOZ de NÓS (pronome e plural de NÓ), VOZ de
VÓS (pronome), VEZ de VÊS (verbo VER) ou PAZ de PÁS (plural de PÁ),
evidenciando que ha logar para as mais diversas situações accentuadas,
impossiveis de evitar.


Caso o leitor Oswaldo não se satisfaça com taes explicações, não vou
ficar indignado quando elle quizer graphar ASSIZ ou PARIZ, desde que
elle siga o mesmo criterio em JESUZ e MOYSEZ, para manter uma coherencia
que, esta sim, será delle e de ninguem mais. Rapaz audaz, esse que quiz
ser meu juiz, hem?


Aos interessados deixo o link para um menu na nuvem donde podem baixar
os archivos do DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO e de outras obras pertinentes.


https://www.dropbox.com/sh/m8jq3615v16g2zt/AACEKn9GzBQUpQmyutQU6Bnha?dl=0


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sexta-feira, 28 de outubro de 2016

NOVEMBRO/2016: PÁO COMBINA COM BOCETA?


Nós, etymologistas, somos como os monarchistas: poucos mas mais
realistas que o rei. Tão zelosos que nada deixamos excappar. Assim são
os seguidores deste bloguinho de notas. Pegam no meu pé emquanto não os
convenço de que as convenções que adopto, quando não estão embasadas na
pura etymologia, baseiam-se no factor consuetudinario (a forma historica
mais arraigada) ou, em ultima analyse, numa questão de coherencia,
sempre visando fixar os graphemas menos simplificados, em funcção duma
esthetica classicizante e (Por que não?) sophisticada.


Este preambulo vem a proposito da questão levantada por um leitor nos
seguintes termos: ja que recommendo, em muitos casos que o systema mixto
tornava indecisos, a preferencia pela vogal "O" em detrimento do "U",
como em BOCETA ou MOLEQUE, qual a razão pela qual prefiro PAU, MAU e
NICOLAU às formas terminadas em "ÁO" (PÁO, MÁO e NICOLÁO)? "Não seria
incoherente?", pergunta o leitor.


Minha resposta é que, entre duas incoherencias, excolho aquella que
causa effeitos menos damnosos ao conjuncto da obra, ou ao universo
lexico. Primeiramente, cabe lembrar que nem sempre a opção pelo "O"
tinha fundamentação etymologica. A palavra LOGAR, por exemplo, guardava
coherencia com LOCAL, do latim LOCALIS. Entretanto, BOCETA vem de
BUXIS/BUXIDIS e MOLEQUE do africano MULEKE, ou seja, às vezes a opção
pelo "O" seria uma tradição crystallizada no proprio portuguez. Isso não
tira a legitimidade de BOCETA ou MOLEQUE, pois, como accabei de allegar,
o factor consuetudinario pesa tanto quanto a authenticidade etymologica.


No caso de PAU, MAU ou NICOLAU (latim PALUS, MALUS e NICOLAUS,
respectivamente), a tendencia mais correcta seria graphar mesmo com "U".
Assim faço eu, mas deixo a criterio de cada um optar pelas formas PÁO,
MÁO e NICOLÁO, ja que a tradição vem legitimar ambas as excolhas. Minha
coherencia, no caso, é com um principio que chamo da "minima
accentuação", pelo qual dispenso um agudo, um circumflexo, um til ou uma
cedilha sempre que posso, como em LUIZ (em logar de LUÍS), PORTUGUEZ (em
logar de PORTUGUÊS) MAÇAN (em logar de MAÇÃ) ou SUISSA (em logar de
SUÍÇA), donde a conveniencia de graphar PAU em logar de PÁO. Mas ha
ainda outra conveniencia, bem mais practica, principalmente em tempos de
digitação informatizada: o emprego do "U" evita confusões entre o agudo
e o til em palavras como PÃO, MÃO, NÃO, BABÃO etc. em relação a PÁO,
MÁO, NÁO e BABÁO.


Não fica nisso a minha coherencia. Si eu preferisse o graphema "ÁO" ao
"AU", teria de preferir "ÉO" a "ÉU" e escreveria CHAPÉO e CÉO em vez de
CHAPÉU e CÉU. Sim, haveria tradição para me fundamentar, mas, nesse
caso, eu teria de escrever EUROPÊO e LYCÊO quando o som do "E" fosse
fechado. Tambem haveria alguma fundamentação historica para tal, mas,
convenhamos, seria uma plethora de agudos e circumflexos perfeitamente
dispensaveis, não acham? Si um dos maiores problemas da orthographia
reformada é a quantidade de accentos, não precisamos arrhumar tal
problema tambem na orthographia preservada, é ou não é?


A esse respeito, illustro meu commentario com um trecho do MANUAL
ORTHOGRAPHICO BRAZILEIRO de Julio Nogueira:


{O nosso Lyceu de Artes e Officios e o Syllogeu são, pelo menos nas suas
fachadas, LYCÊO e SYLLOGÊO, graphias pouco acceitaveis, não só do poncto
de vista practico como do scientifico. A palavra SYLLOGEU, formada de
elementos gregos pelo Dr. Ramiz Galvão (1904) assim se acha escripta no
seu "Vocabulario" e significa "a casa onde se reunem associações
litterarias e scientificas".}


Apesar de desrecommendar o graphema "ÊO", porem, Nogueira recommenda
"ÉO" em caso da vogal aberta, como em CÉO, CHAPÉO, VÉO, TROPHÉO,
ESCARCÉO, BORNÉO, MAUSOLÉO, BORDÉOS, MONTEVIDÉO. Por isso não fecho
questão, adoptando CHAPÉU mas admittindo CHAPÉO caso a cabeça não seja a
minha, que, aliaz, usa bonné.


Ainda a proposito do termo PAU no sentido phallico e de seu equivalente
feminino BOCETA, nunca é tarde para registrar que o substantivo ROLLA
(que, como synonymo de POMBA, suggeriria a vagina e não o penis)
deveria, por força do factor historico, levar "L" duplicado, até porque
seu formato ROLLIÇO remette ao masculino ROLLO que, como ROL, vem do
latim ROLLUS que, por sua vez, vem de ROTULUS. Dahi que, mesmo sendo
forma corrente no systema mixto, o verbo ROLLAR com um só "L" passou
pela minha tardia correcção, bem como seus correlatos ENROLLAR e
DESENROLLAR, ao lado de ROLLETA, ROLLINHO, ROLLÊ, ROLLEZINHO, ROLLANTE,
etc. Em summa, a todo momento estamos deante de formas apparentemente
simples que, si cuidadosamente pesquisadas, appresentam algo mais
complexo, a despeito da ommissão dos diccionarios, que tendem a
registrar apenas ROTULUS como etymologia de ROLLO, induzindo o
consulente a acceitar as formas simplificadas "ROLO" e "ROLA".


Aos interessados deixo o link para um menu na nuvem donde podem baixar
os archivos do DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO e de outras obras pertinentes.


https://www.dropbox.com/sh/m8jq3615v16g2zt/AACEKn9GzBQUpQmyutQU6Bnha?dl=0


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sexta-feira, 30 de setembro de 2016

OUTUBRO/2016: CHORANDO NO KHORO OU CORANDO NO CHORO?


Antes da questão de fundo a que me reporto mensalmente, quero deixar
registrado o commentario que postei no facebook a proposito dos eventos
septembrinos. Começados os jogos parolympicos, fiquei alliviado ao ouvir
uma entrevista dada pelo amigo Mizael Conrado, hoje vice-presidente do
Committê Parolympico, que pronuncia correctamente a palavra PAROLYMPICO,
pois a palavra OLYMPO e seus derivados jamais perdem a vogal inicial. Ja
o prefixo grego PARA perde a ultima vogal sempre que o pospositivo
começar por vogal. Assim, PARA+ONOMASIA dá PARONOMASIA; PARA+OXYTONO dá
PAROXYTONO; PARA+ESTHESIA dá PARESTHESIA; PARA+ALLELO dá PARALLELO;
PARA+ATHLETA dá PARATHLETA. Em casos como PARAMILITAR ou PARAPLEGICO é
claro que o antepositivo não se altera. Lembrando que em palavras como
PARACHOQUE, PARAPEITO ou PARAQUEDAS o prefixo vem do verbo PARAR e que
na boa orthographia ellas não levam hyphen. Ja expliquei tudo isso neste
blog e não comprehendo por que alguns insistem na erronea forma
"PARALYMPICO", incorrecta até no inglez, idioma em que tambem existem os
equivalentes de PARONOMASIA ou PAROXYTONO. Será que é contagiosa a
burrice de alguem que falle duma "presidenta innocenta"? Em todo caso,
fique claro que o substantivo masculino JUMENTO admitte o feminino
JUMENTA. Isto posto, vamos a outra questão.


Um attento e attencioso leitor, que sempre me escreve mas prefere
manter-se no anonymato, volta a inquirir-me accerca do dilemma entre
homographia e homophonia que divide as alternativas CORO e CHORO, CHORO
e CHORO ou KHORO e CHORO, considerando que uma accepção é a de canto e a
outra de pranto, face ao facto de que em portuguez coexistem duas
sonoridades para o digramma "CH", como em CHIMERA parallelamente a
CHINELO.


Ja deixei clara a minha preferencia pela forma KHORO para canto e CHORO
para pranto, mas nunca é demais voltar ao thema. Desta feita transcrevo
o pertinente trecho de Nogueira no MANUAL ORTHOGRAPHICO BRAZILEIRO para
depois fazer minhas considerações finaes.


{Segundo alguns a representação da articulação "KÊ" por "CH" em palavras
de origem grega é impropria. Julio Ribeiro não se conforma com ella,
declarando que o facto de exprimir o latim aquella articulação por "CH"
não é razão para que o portuguez o fizesse. Acha que em latim a
posposição do "H" ao "C" é acceitavel porque o "C" naquelle idioma tinha
o som forte de "KÊ" e assim o digramma "CH" podia, com propriedade,
exprimir o "X" (chi grego). No portuguez não, porque o "H" em concurso
com o "C" produz ja o valor de "XÊ" e conferir-lhe ainda o effeito de
"KÊ" importa crear duvidas na pronunciação. Essa observação é de todo
poncto justa e fosse lembrada ao tempo em que se manifestaram as
tendencias graphicas, decerto o "CH" não viria pleitear com o "K" e com
"QU" a representação da articulação guttural "KÊ". Hoje, porem, seria
impossivel qualquer alteração. Por outro lado o dr. Ramiz Galvão entende
que o representante genuino do chi grego é o "CH". A sua revolta é,
pois, em sentido contrario. Acha correctissimas as graphias MECHANICA,
EPOCHA, CHÔRO etc., e lamenta que o uso fixasse outras erroneas como
KILOMETRO, KILOGRAMMO etc., onde a articulação inicial transcreve o chi,
pelo que deviam taes palavras escrever-se: CHILOMETRO, CHILOGRAMMO, como
no italiano. As palavras em que a lettra composta dessa procedencia é
inicial são todas de formação erudita. Dentre ellas as mais vulgares
são: CHALDEU, CHAOS, CHIMERA, CHIMICA, CHIROMANCIA, CHLAMYDE, CHLORO,
CHOLAGOGO, CHOLERA (MORBUS), CHORÉA, CHOREU, CHOREOGRAPHIA,
CHOROGRAPHIA, CHRISMA, CHRISTO, CHROMO, CHRONICA, CHRYSALLIDA, CHYMO,
CHYLO e suas congeneres: CHALDAICO, CHAOTICO, CHIMERICO, CHIROMANTE,
CHLORATO, CHLORAL, CHOLERINA, TERPSICHORE, CHOROGRAPHICO, CHRISMAR,
CHRISTÃO, CHRISTIANISMO, ANTICHRISTO, CHROMATICO, ANACHRONICO,
ANACHRONISMO, CHRONOLOGIA etc. Do elemento ARCHE ha numerosas formações:
ARCHANJO, ARCHONTE, ARCHEOLOGIA, ARCHETYPO, ARCHIDUQUE, ARCHITECTO,
ARCHIVO, MONARCHIA, ANARCHIA, OLIGARCHIA, PATRIARCHADO (PATRIARCHA). A
transcripção por "CH" encontra-se, outrosim, no corpo das palavras
simples ou compostas de origem grega: MACHINA, TECHNICA (TECHNOLOGIA,
POLYTECHNICA, TECHNOGRAPHIA), ORCHESTRA, PSYCHOLOGIA, ECHOLALIA etc. Por
vezes uma alteração prosodica determinou a perda do "H". A influencia do
"E" e do "I" posteriores ao "C" fez-se sentir, apesar da intercorrencia
do "H", em ARCEBISPO, ARCEBISPADO, ARCEDIAGO, ARCEDIAGADO, ARCIPRESTE,
ARCIPRESTADO. Reapparesce o "H" e, com elle, o som guttural na formação
erudita - ARCHIEPISCOPAL. Foi ainda a mesma influencia que transformou a
prosodia e a escripta de CHIRURGIA em CIRURGIA (CIRURGIÃO, CIRURGICO). A
explicação é que estas palavras se vulgarizaram ao passo que as demais,
pela sua applicação erudita, estiveram fora do alcance dessa chymica
popular da linguagem. Outro exemplo se encontra em CATECHISMO, que se
pronunciava dando ao "CH" correspondente ao chi o valor de "KÊ", ainda
conservado em CATECHESE, CATECHIZAR. Mas a acção popular reduziu o "KÊ"
para "CÊ" e da pronuncia CATECISMO resultou essa graphia. Cabe ainda
mencionar a graphia BATRACIOS, indicadora de uma prosodia diversa da
rigorosamente etymologica: BATRACHIOS. Perdeu-se o "H" de ESCOLA,
ELENCO, CARTA, ACROSTICO, CARACTER, COLERA (SENTIMENTO), HYPOCONDRIO e
derivados; AUTOCHTHONE ja se escreve tambem AUTOCTHONE. O dr. Ramiz
Galvão propõe uma distincção graphica entre CARTA (MISSIVA) e CHARTA
(MAPPA), CHARTOGRAPHIA etc., sem embargo da communidade de origem. Esta
distincção não tem sido feita na graphia usual. Está vacillante o "H" de
EPOCA, CORO, MECANICA, MELANCOLIA, que ja preferimos assim. A tendencia
é para simplificar; antes de "E", "I", "Y" (CHELONIO, MONARCHIA, CHYMO,
CHYLO) a representação se manterá, a menos que se dê corrupção
prosodica, como accontesceu em CIRURGIA, CATECISMO. Para manter o valor
guttural sem o "CH" seria preciso confiar esse papel ao "K" ainda mais
extranho à physiognomia das nossas palavras ou o digramma "QU", que,
alem de nada simplificar, geraria duvidas na pronuncia.}


Com effeito, o nosso Nogueirinha é mesmo um authentico vacillão! Si,
como elle às vezes affirma, "a tendencia é para simplificar", seu manual
nem teria razão de ser e elle não precisaria fazer a vehemente defesa
que faz, em outros momentos, da orthographia etymologica: bastava
capitular duma vez às correntes phoneticistas que, ja àquella epocha
(decada de 1920, quando sua obra foi publicada), propunham a reforma que
em 1943 seria officializada no Brazil. Mas, grande conhescedor da lingua
que era, Nogueira teve o merito de registrar posições antagonicas, como
as de Julio Ribeiro e de Ramiz Galvão no paragrapho accyma transcripto
entre chaves. Obviamente estou aqui para referendar a opinião de Galvão
e para refutar a de Ribeiro, si não tambem este blog não teria razão de
ser. Cabe, então, apponctar os casos em que não endosso os commentarios
de Nogueira.


Primeiramente, ja expliquei por que admitto as formas KILOMETRO e
KILOGRAMMA ao lado de CHILIOGONO: teriamos que graphar CHILIOMETRO e a
abbreviatura KM perderia o sentido. O verdadeiro elemento compositivo
para "mil" é CHILIO e não CHILO, que significa "labio". Lamento, neste
poncto, ter de corrigir Galvão, com quem sympathizo. A graphia correcta
de CHYMICA é com "Y" e não com "I" como acceita Nogueira. Em hypothese
nenhuma posso admittir que o "H" se tenha "perdido" em EPOCHA, ESCHOLA,
ELENCHO, CHARTA, CHARACTER, ACROSTICHO, CHOLERICO, HYPOCHONDRIACO ou
AUTOCHTHONE, como deixo claro nos commentarios addicionaes ao meu
DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO. Não vejo necessidade de distinguir CARTA de
CHARTA e acho que o "H" deve valer tanto em CHARTEIRO como em
CHARTOGRAPHO. Nem por sombra acho "vacillante" o "H" de MECHANICA ou
MELANCHOLIA. Quem disse que preferimos assim? Quem preferir que escreva
sem "H"; eu não. Não é o "H" que estaria "vacillante": Nogueira é que
era vacillão! Os unicos casos em que admitto o desapparescimento do "H"
são os de CATECISMO, CIRURGIA, ARCEBISPO etc., consolidados pela
tradição, mais que pela importancia da prosodia. Apenas como excepção
prosodica, analoga à excepcionalidade do "K" em KILOMETRO ou
KALEIDOSCOPIO, é que o adopto em KHORO para differenciar de CHORO, pois
acho CORO simplificado demais. Ja que, pela minha optica, a tendencia
deve ser para complicar (estheticamente fallando, no sentido da
sophisticação classicista), não posso concordar com Nogueira e prefiro
KHORO a CORO, emfim.


Vale salientar o motivo pelo qual Nogueira e outros auctores tanto
alludiam ao facto de, aqui ou alli, alguem "preferir" assim ou assado:
antes de 1943 vigorava um systema dicto "mixto", pelo qual cada
escriptor estaria livre para adoptar graphemas mais ou menos rigorosos,
como os de CARTA ou CORO em relação a CHARTA e KHORO. Dahi que,
contrario que sou a quaesquer leis que tractem phenomenos linguisticos
como si fossem materia politica ou burocratica, continuo partindo do
principio de que cada escriptor tem de ficar à vontade para decidir si
acceita ou não as novas regras, que, em ultima analyse, teem de ser
propostas e não impostas.


Aos interessados deixo o link para um menu na nuvem donde podem baixar
os archivos do DICCIONARIO ORTHOGRAPHICO e de outras obras pertinentes.


https://www.dropbox.com/sh/m8jq3615v16g2zt/AACEKn9GzBQUpQmyutQU6Bnha?dl=0


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